Jul
17
2024
By admin
Por Alberto Reis
Há cem anos, o genial fı́sico Paul Dirac deu um passo gigantesco. Ao reunir a Teoria da Relatividade com a recém-criada Mecânica Quântica, Dirac mostrou algo inesperado: as antipartı́culas. A princı́pio, a teoria de Dirac despertou pouco interesse. Mas isso mudou poucos anos depois, quando a primeira antipartı́cula, o anti-elétron, foi detectada. Ela foi batizada como pósitron.
O espanto foi generalizado. De repente, descobre-se que havia um mundo espelhado, de cuja existência ninguém suspeitava, algo jamais imaginado. Depois do pósitron, muitas outras antipartı́culas foram encontradas. Hoje sabemos que para cada partı́cula, corresponde uma antipartı́cula.
Não há nada misterioso a respeito das antipartı́culas. São cópias quase idênticas das partı́culas, a única diferença entre elas é a carga elétrica: o elétron tem carga negativa, a do pósitron é positiva. Todas as demais propriedades são iguais. Assim como os antielétrons, existem antiprótons e antinêutrons, e juntos formam antiátomos. A matéria é feita de átomos, a antimatéria é feita de antiátomos.
O que chamamos de matéria e de antimatéria é, na verdade, uma mera convenção. Se fôssemos feitos de antimatéria, não perceberı́amos nenhuma diferença. Você e o seu antivocê seriam idênticos, mas um simples aperto de mão seria fatal: partı́culas e antipartı́culas se aniquilam mutuamente quando se encontram.
Desde a sua descoberta, as antipartı́culas são muito estudadas. Nos grandes aceleradores de partı́culas, antipartı́culas são criadas rotineiramente. As propriedades da antimatéria, no entanto, só começaram a ser analisadas nos anos 1960, quando o primeiro antiátomo de hidrogênio foi criado em laboratório. Desde então, estudos cada vez mais precisos têm sido feitos para verificar se, de fato, a matéria e a antimatéria se comportam exatamente da mesma maneira.
O experimento mais moderno sobre a antimatéria, o ALPHA, está em andamento no CERN, na Suı́ça, com importante participação brasileira. É um experimento bastante engenhoso e de altı́ssima precisão, em que é possı́vel produzir um único antiátomo de hidrogênio, formado por um pósitron e um antipróton, e mantê-lo isolado durante um certo tempo.
Usando feixes de laser, os cientistas conseguem fazer com que o antihidrogênio absorva energia. Quando isso acontece, o pósitron sai do seu estado de equilı́brio e “pula”para um nı́vel de energia mais alto dentro do antiátomo. Mas fica pouco tempo ali. Após um curtı́ssimo intervalo de tempo, uma fração ı́nfima de um segundo, o pósitron volta ao seu estado energético original. A energia que o antiátomo havia absorvido é emitida na forma de luz.
Os pesquisadores do ALPHA mostraram que tudo acontece exatamente da mesma forma quando o experimento é repetido com átomos de hidrogênio. A energia absorvida e na sequência emitida pelo antihidrogênio é idêntica à que o átomo de hidrogênio absorve e emite nas mesmas condições. Mostraram também que a gravidade atua da mesma maneira em átomos e antiátomos. Esse é um feito espetacular, pois os átomos são levı́ssimos. Para observá-los em queda livre foi preciso vencer desafios tecnológicos gigantescos.
Não pense, no entanto, que existe um anti-Universo paralelo. Não podemos “sair”do Universo para ver o que há lá fora. Não existe um lado de “fora”. Se existissem regiões dominadas por antimatéria, haveria fronteiras com as regiões onde há matéria. Na interface dessas regiões, partı́culas e antipartı́culas se aniquilariam continuamente, produzindo um efeito que seria observável, pois a energia não desaparece.
Mas isso não foi observado até o presente. Qualquer que seja a direção que apontemos nossas antenas e telescópios, sempre vemos a mesma coisa: a matéria que vemos no Universo é feita dos mesmos elementos que encontramos aqui na Terra. Nenhum indı́cio de antimatéria.
Ora, se são equivalentes, se têm as mesmas propriedades, onde está a antimatéria? Como chegamos a um Universo composto apenas por matéria? Esse é um dos grandes enigmas da Fı́sica.
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